Pessoas com Deficiência psicossocial/transtornos mentais

Bacharel em Serviço Social pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas/UniFMU em 2007, Cursando MBA em Gestão Pública. Especialista em CIF pela CIF/Brasil e Unifesp; com certificação internacional (APMG, 2018) em Gerenciamento de Projetos e Programas Sociais (PMD Pro 1 e PgMD). Ministra aulas em cursos de extensão na Unifesp, Coordenadora de Projeto de Inclusão profissional para pessoas com deficiência psicossocial (Inserir-Unifesp); Responsável Técnica pelo acompanhamento social de pacientes e familiares atendidos pelo Programa de Esquizofrenia (Proesq-Unifesp). Consultora Biopsicossocial para inclusão de pessoas com transtornos mentais e assistência judiciária. Palestrante e representante dos direitos das pessoas com esquizofrenia, participando da elaboração, articulação e apresentação de projetos de lei, eventos e movimentos de defesa e garantia de direitos.

Inclusão Profissional da Pessoa com Deficiência Psicossocial

A inclusão profissional de pessoas com deficiência é um tema amplamente discutido nos últimos anos no Brasil e quase sempre, está relacionado à contratação por meio de cotas, atendendo aos dispositivos da Lei 8.213/91 artigo 93 que estabelece que:

“A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência”.

O surgimento dessa obrigatoriedade imposta às empresas é resultado de um amplo processo de defesa de direitos e um passo importante para cidadania e inclusão profissional da pessoa com deficiência.

Na História da Humanidade, a pessoa com deficiência foi por muito tempo considerado incapaz e assim, discriminado, excluído de participação social e subtraído de seus direitos civis. Se na Antiguidade e Idade Média, eram até mesmo mortas por serem consideradas defeituosas, aberrações e até endemoniadas, no início do século XVIII, a Igreja Católica passou a considerá-las objeto de caridade, assistencialismo e portanto, dependentes de terceiros e incapazes de decidirem sobre os rumos de sua própria vida.

No Brasil do século XX, entidades de atendimento e representação de direitos de pessoas com deficiência, como as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAEs), começaram a surgir e iniciaram importantes atividades de inclusão social, reforçando a necessidade de se oferecer serviços especializados que contribuíssem ao desenvolvimento integral de pessoas com deficiência.

A trajetória da inclusão de pessoas com deficiência é, portanto, uma trajetória marcada por lutas, vivida na História da Humanidade com muitas dores e injustiças e arraigada de uma cultura assistencialista que descredita à pessoa com deficiência, sua capacidade de autonomia e dignidade.

Falar sobre acessibilidade da pessoa com deficiência no trabalho é antes de tudo, falar da concretização de direitos fundamentais, do exercício da cidadania e da responsabilidade de toda sociedade em fazer valer o que em lei se conquistou tão recentemente.

Por outro lado, quando propomos a discussão sobre inclusão de um segmento tal na sociedade, evidenciamos uma realidade excludente, que historicamente segregou e fez do meio que em que vivemos um ambiente cheio de barreiras, por vezes, inacessível a algumas pessoas.

Por estarmos em uma sociedade marcada por desigualdades, temos a necessidade de estabelecer leis e normas que assegurem direitos para todos, e em todos os espaços.

Foi exatamente assim, que progressivamente as legislações sobre a inclusão de pessoas com deficiência no trabalho evoluíram.

Desde a promulgação da lei de cotas em 1991, o estado brasileiro vem cobrando das empresas de médio e grande porte, a entrada de jovens e pessoas com deficiência no mercado de trabalho formal, seguindo normativas pactuadas por organizações internacionais, como comentado a seguir:

  • Lei de Cotas 8.213/91: contratação por reserva de vagas para pessoas com deficiência por empresas com mais de cem funcionários. Pela primeira vez, é regulamentada a entrada de pessoas com deficiência no mercado de trabalho no Brasil.
  • Lei do Aprendiz 10.097/00: contratação por programa de aprendizagem profissional para jovens de 14 à 24 anos. Para pessoas com deficiência, a lei estabelece mínimo de dezoitos anos para contratação, e não estabelece limite de idade. Estabelece ainda que a comprovação de escolaridade de pessoa com deficiência mental considerará as habilidades e competências relacionadas à profissionalização.
  • Lançado pela Organização Internacional do Trabalho, o pacto pelo Trabalho Decente em 2003: em 2007 o Brasil, lançou a Agenda para o Trabalho Decente e em 2010 o Plano Nacional de Emprego e Trabalho Decente para geração de mais e melhores empregos, igualdades de oportunidades e tratamento, erradicação do trabalho escravo e infantil.
  • Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU, 2008): ampliação do conceito de deficiência, entendida como impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas.
  • Em 2009, através do Decreto Federal 6.949 o Brasil promulgou a Convenção, se comprometendo a cumprir e executar seus dispositivos integralmente em território nacional.
  • Decreto 7.612 em 2011: institui o plano nacional dos direitos da pessoa com deficiência, tendo em suas diretrizes a ampliação da participação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, mediante sua capacitação e qualificação profissional.
  • Lei Brasileira de Inclusão (13.146/15): consolida a Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência para uma sociedade inclusiva e reforçando a concepção de que a deficiência depende do meio em que a pessoa está inserida.

O entendimento que a deficiência não está na pessoa, mas antes, no ambiente é um marco na luta e mudança de paradigmas. Assim, a deficiência não é uma condição patológica, exclusiva da pessoa, mas antes, é uma condição socioambiental.

A complexidade das barreiras que permitem o acesso dessa pessoa a direitos como trabalho, educação, saúde e moradia, é que caracterizam a presença de uma deficiência, como estabeleceu a Convenção Internacional para os Direitos da Pessoa com Deficiência pela ONU no ano de 2008, e como destacou a Lei Brasileira de Inclusão (13.146/15):

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

  • 1º A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará: 

 I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;

II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

III - a limitação no desempenho de atividades; e

IV - a restrição de participação.

Com o avanço das políticas e leis destinadas pessoas com deficiência, hoje a classificação de deficiência considera portanto, fatores multidimensionais da funcionalidade humana. A compreensão da relação que a pessoa tem com o ambiente, passa a ser determinante para classificação de deficiência e indispensável para abordagem dos profissionais que trabalham com inclusão, para garantir a acessibilidade adequada.

Paralelamente, a partir do ano 1978 no Brasil, diversos movimentos sociais iniciaram reivindicações de direitos a pacientes psiquiátricos. Alinhado a movimentos em diversos países, essas reivindicações buscavam a reestruturação da assistência psiquiátrica com a reversão do modelo hospitalocêntrico.

Em 2001, o Brasil promulgou a lei 10.216 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais. Também conhecida como a lei da Reforma Psiquiátrica, essa lei é um marco na saúde mental pela luta antimanicomial que acompanhou movimentos similares de vários outros países, em favor da dignidade de tratamento, contra internações psiquiátricas, cobrando da sociedade a convivência familiar e comunitária das pessoas com transtornos mentais e oportunidades para uma vida pautada em dignidade, respeito e direitos sociais.

Essa lei foi responsável pelo fechamento de diversos hospitais psiquiátricos (ou manicômios) que por muitos anos, foram locais de tortura, abandono e violência institucionalizada.

Com o intenso debate em torno de qual modelo de atenção seria adotado pela política nacional de saúde mental, foi proposto um modelo de rede com base territorial e comunitária, com progressiva redução de leitos em hospitais psiquiátricos, normatização e fiscalização das internações psiquiátricas, reversão dos gastos em saúde mental e garantia de direitos de cidadania para as pessoas com transtornos mentais.

Como proposto pela Reforma Psiquiátrica no Brasil, o tratamento das pessoas com transtornos mentais passou a ser feito em serviços de saúde próximos de sua residência: “O tratamento visará, como finalidade permanente, a reinserção social do paciente em seu meio.” (Lei 10.216/01 Artigo 4º, § 1o)

Diversos equipamentos passaram então a integrar a política de saúde mental, como por exemplo, a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) no ano de 1986 (Caps Itapeva).

Com objetivo de oferecer tratamento especializado e multiprofissional para pessoas com transtornos mentais em local próximo de sua residência, os CAPS passaram a ser a porta de entrada para reabilitação e suporte psicossocial, através de atendimento clínico e reinserção social pelo acesso ao trabalho, lazer, cidadania e fortalecimento de vínculos.

Da mesma forma que a acessibilidade ao trabalho para pessoas com deficiência é marcada por uma história de exclusão, a inclusão social de pessoas com transtornos mentais é de igual forma, ou ainda pior, uma trajetória evidenciada pela marginalização de direitos civis.

As pessoas com transtornos mentais estiveram historicamente à margem da sociedade. Antes da Reforma Psiquiátrica, eram depositadas em manicômios ou afastadas do convívio social e compulsoriamente interditadas de seus direitos civis, por serem consideradas alienadas.

Com a evolução do conceito de deficiência, a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, foi possível requerer o direito de acessibilidade no trabalho também às pessoas com transtornos mentais, uma vez que identificado os impedimentos destas em relação a interação com o ambiente.

Considerando os impedimentos de natureza mental, que implicam em limitações na função do corpo – neste caso para transtornos mentais, e, portanto de funções mentais – os transtornos psiquiátricos podem acarretar limitações e prejuízos significativos que implicam em permanentes déficits intelectuais e de cognição que ainda que sejam tratados clinicamente, dependem do que o ambiente oferece para terem plena participação social e igualdade de oportunidades, como o acesso de medicação e intervenções multiprofissionais por período de tempo indeterminado.

Tais aspectos da funcionalidade da mente humana, são facilmente identificados no acompanhamento terapêutico de pessoas com transtornos mentais, seja por exame psíquico ou por avaliações biopsicossociais.

Como proposto pela Lei Brasileira de Inclusão, a avaliação de deficiência pode ser biopsicossocial para melhor identificação dos impedimentos e barreiras que interagem com indivíduo para considera-lo com deficiência:

Art. 2o Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

  • 1o A avaliação da deficiência, quando necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar e considerará:

I - os impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo;

II - os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais;

III - a limitação no desempenho de atividades; e

IV - a restrição de participação.

A quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) lançado em 2013, é uma referência na prática clínica para diagnóstico e tratamento dos transtornos mentais. Busca padronizar universalmente a linguagem sobre as características de cada transtorno, para comunicação precisa de estatísticas de saúde pública em conformidade com a Classificação Internacional de Doenças (CID).

Ao descrever os aspectos que definem cada transtorno, o DSM-V traz informações precisas sobre o impacto nas funções mentais que comprometem a funcionalidade do indivíduo e que em casos graves ou crônicos, o prejudicam por toda vida.

Como um exemplo de transtorno mental grave, podemos citar os transtornos psicóticos e esquizofrenia. Esses transtornos são definidos por anormalidades em um ou mais dos cinco domínios a seguir: delírios, alucinações, pensamento (discurso) desorganizado, comportamento motor grosseiramente desorganizado ou anormal (incluindo catatonia) e sintomas negativos (DSM-V, p. 131).

Na mesma época de publicação da Lei 10.216 que reformulou a assistência psiquiátrica no Brasil, o mundo inteiro também discutia na ONU a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF. Com sua primeira publicação em 2001 pela Resolução 5421 da Organização Mundial de Saúde, a CIF veio para complementar a Classificação Internacional de Doenças (CID) e padronizar uma linguagem universal que melhor descrevesse e avaliasse a funcionalidade humana considerando aspectos multidimensionais e por isso, é considerada um marco no debate sobre deficiência.

Alinhado aos demais países membros da ONU, o Brasil acompanhou as definições e reconhecimentos internacionais dos direitos das pessoas com deficiência, conforme Decreto Federal 6.949/09, ratificando a Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que já reproduzia inclusive, o entendimento da CIF sobre deficiência a ser considerada como problemas nas funções ou estruturas do corpo, tais como, um desvio importante, perda ou limitações.

Desta forma, a funcionalidade humana diz respeito aos aspectos positivos de participação e atividades em que o indivíduo interage em seu contexto sócio ambiental e, a incapacidade e deficiência, decorre das limitações e são portanto, os aspectos negativos que restringem a participação do indivíduo em seu contexto sócio ambiental.

O Brasil acompanhou a mudança de paradigmas sobre a deficiência, ao mesmo passo que importantes mudanças na política nacional de saúde mental estabeleciam objetivos claros para promoção e suporte para inclusão e reabilitação profissional de pessoas com transtornos mentais, sendo essa questão inclusive reforçada nos objetivos da Rede de Atenção Psicossocial, criada em 2011 pelo Ministério da Saúde pela Portaria 3.088:

Artigo 4º, IV - Promover a reabilitação e a reinserção das pessoas com transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas na sociedade, por meio do acesso ao trabalho, renda e moradia solidária.

As primeiras iniciativas no campo da saúde mental de impacto para geração de renda e trabalho para pessoas foram experimentadas no formato de cooperativismo e autogestão de interesse dos trabalhadores conhecido como Economia Solidária e regida por valores como:

  • posse e/ou controle coletivo dos meios de produção, distribuição, comercialização e crédito;
  • gestão democrática, transparente e participativa dos empreendimentos econômicos e/ou sociais;
  • distribuição igualitária dos resultados (sobras ou perdas) econômicos dos empreendimentos.

A inclusão no trabalho para pessoas com transtornos mentais caminhou a passos lentos e desconfiados desde a Reforma Psiquiátrica e ainda hoje, é marcada por estigmas, desinformação e exclusão.

Por outro lado, há que se considerar também a contraditoriedade em se promover a inclusão no trabalho para pessoas em sofrimento psíquico. Isso porque, o trabalho é considerado também um dos principais motivos de adoecimento mental.

Mas ainda que seja um risco ao adoecimento, o trabalho é também permeado por subjetividades que compreendem a definição de papel social dando significado a existência humana e compondo de forma relevante a consciência de felicidade a partir da satisfação com realização pessoal, profissional e bem-estar que o indivíduo faz sobre si, como bem apresentado no Índice de Bem-Estar Brasil, premiado pela ONU e publicado em Janeiro de 2014.

Entre debates e estudos sobre o assunto que vão desde a discussão sobre terminologia mais adequada, aspectos ideológicos, clínicos e psicossociais há o fato de que apesar dos esforços legais para inclusão profissional de pessoas com deficiência, os índices mostram que há ainda um longo caminho a se percorrer, uma vez que a deficiência mental é ainda o segundo tipo de deficiência com menor número de pessoas empregadas no Brasil.

Apesar dos avanços, se não fosse a lei de cotas, talvez não tivéssemos nem os quase 1% de trabalhadores com deficiência empregados com carteira assinadas atualmente no Brasil.

Em 2017, apenas 0,95% do total de empregados no Brasil foram pessoas com deficiência. No que tange a distribuição entre os tipos de deficiência, 48% dos empregados foram pessoas com deficiência física; 19% com deficiência auditiva, 14% com deficiência visual; 8% com deficiência intelectual e 2% com deficiência múltipla, demonstrando portanto, uma inclusão não igualitária (RAIS/Ministério do Trabalho, 2017).

Como se pode perceber, há ainda a gravíssima situação da inexistência de dados estatísticos sobre a contratação de pessoas com deficiência mental e psicossocial no Brasil. As bases de dados estatísticos da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), não permitem alimentar o sistema com informações sobre o tipo de deficiência psicossocial, tornando impreciso e confuso os dados existentes.

Ainda que cerca de 24% da população brasileira possua algum tipo de deficiência (Censo IBGE, 2010) os dados atuais sobre a distribuição por tipo de deficiência, supõe que a deficiência mental e psicossocial estejam contabilizadas no tipo intelectual.

Mas o que são as deficiências psicossociais? O que as difere da deficiência mental?

A partir da Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual, aprovada em 6/10/04 pela Organização Mundial da Saúde (OMS, 2004), em conjunto com a Organização Panamericana de Saúde (Opas), o termo “deficiência mental” passou a ser considerada apenas como “deficiência intelectual”.

Segundo Romeu Sassaki, as deficiências psicossociais são as sequelas de transtornos mentais. Diferente de transtorno mental, as deficiências psicossociais são quando quadros psiquiátricos já estabilizados, acarretam limitações e prejuízos das funções mentais do indivíduo de forma permanente. Assim, nem todo transtorno mental é uma deficiência psicossocial. Mas sim, aquele em se identificam sequelas permanentes. Os transtornos bipolares, transtornos psicóticos e a esquizofrenia são os mais comuns na trajetória de inclusão no mercado de trabalho por lei de cotas para pessoas com deficiência, sendo inclusive já apontados pelo Ministério do Trabalho em Instrução Normativa 98/2012.

Contudo, não há como se estabelecer rigorosamente que toda pessoa com esquizofrenia ou bipolaridade sejam consideradas pessoas com deficiência psicossocial. O que vai definir a existência de uma deficiência por transtorno mental, são os impedimentos de natureza mental que na interação do indivíduo com o ambiente produzem barreira para o acesso ao direito em igualdade de participação com as demais pessoas, e para isso, é previsto pela LBI a avaliação biopsicossocial.

A gravidade de um transtorno mental está principalmente associada ao tempo de início de um tratamento adequado. Quanto mais tempo a pessoa leva para iniciar um tratamento, maiores são os riscos de esse transtorno impactar negativamente na funcionalidade da pessoa.

Seja qual for o transtorno mental existente, na ocorrência de um impacto negativo significativo e de longo prazo nas funções mentais, pode então ser considerada deficiência psicossocial.

Conforme Manual Diagnóstico e Estatísticos dos Transtornos Mentais (DSM-V), são descritos os seguintes transtornos mentais existentes:

- Transtornos do Neurodesenvolvimento: como a deficiência intelectual e atraso global do desenvolvimento.

- Transtornos da Comunicação: como linguagem, fala, gagueira.

- Transtornos do Espectro Autista.

- Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade.

- Transtornos específicos da aprendizagem: como a dislexia e discalculia.

- Transtornos motores: como coordenação, estereotipia, tiques e Tourette.

- Espectro da esquizofrenia e transtornos psicóticos.

- Transtorno Bipolar.

- Transtornos Depressivos.

- Transtornos de Ansiedade.

- Transtornos Obsessivo-compulsivo.

- Transtornos Relacionados a Traumas e Estressores.

- Transtornos Dissociativos.

- Transtornos de Sintomas Somáticos.

- Transtornos Alimentares.

- Transtornos da Eliminação: como enurese diurna ou noturna.

- Transtornos do Sono Vigília: como insônia, hipersonolência e apnéia.

- Disfunções Sexuais.

- Disforia de gênero.

- Transtornos Disruptivos, do Controle de Impulsos e Conduta: como antissocial, cleptomania, oposição desafiante.

- Transtornos Relacionados a Substâncias e Aditivos: como álcool, cafeína, cannabis, alucinógenos e inalantes.

- Transtornos neurocognitivos: como delirium, Alzheimer, lesão cerebral traumática, acidente vascular, infecção por HIV, Parkinson.

- Transtornos da personalidade: como borderline, histriônica, narcisista.

- Transtornos Parafílicos: como exibicionista, masoquismo e sadismo sexual, pedofílico e fetichista.

Todos os transtornos acima descrito, podem ser classificados como deficiência psicossocial a depender de avaliação biopsicossocial que concluirá se as dificuldades e limitações da pessoa correspondem a aspectos transitórios ou permanentes e o grau de impacto na funcionalidade da pessoa.

Alguns transtornos mentais podem ser transitórios e remitidos sem necessidade de prolongada intervenção clínica e multiprofissional. Já outros transtornos considerados graves e persistentes – como os casos de esquizofrenia e transtorno bipolar, ainda que estabilizados produzem prejuízos na funcionalidade humana. Daremos aqui um foco maior para esquizofrenia, que será também relacionada em um estudo de caso para essa aula.

A esquizofrenia é apontada pela Organização Mundial de Saúde como uma das principais causas de incapacidade no mundo. Sua causa ainda não é clara no campo científico, mas aponta fatores de riscos genéticos, ambientais e biológicos.

A esquizofrenia atinge cerca de 1% da população mundial e seus sintomas são caracterizados em:

- Positivos: delírios, alucinações, persecutoriedade, desorganização do pensamento, catatonia, comportamento bizarro, heteroagressividade, alterações do teste de realidade, com surgimento na adolescência ou início da fase adulta.

- Negativos: embotamento afetivo, isolamento social, ambivalência, baixa volição, empobrecimento das experiências emocionais, alogia, disfunção da socialização e anedonia.

O tratamento da esquizofrenia envolve abordagem clínica por psiquiatra e multiprofissional, como realizado por Terapia Ocupacional e Psicoterapia. A abordagem clínica é feita com a manutenção e acompanhamento de medicação antipsicótica que com boa resposta, pode reduzir e até em alguns casos, remitir os sintomas positivos descritos. Mas os sintomas negativos não se tratam com medicações, por isso é fundamental a abordagem multiprofissional com terapias individuais e em grupo que possam apoiar a pessoa com esquizofrenia em se conhecer, relacionar-se e inserir-se no mundo.

A deficiência psicossocial é também chamada “deficiência psiquiátrica” ou “deficiência por saúde mental”. A inserção do tema “deficiência psicossocial” no texto da Convenção representa uma histórica vitória da luta de pessoas com transtornos mentais, familiares, amigos, usuários, trabalhadores, provedores de serviços de reabilitação física ou profissional, pesquisadores, ativistas do movimento de vida independente e demais pessoas em várias partes do mundo. Desta forma, pela primeira vez na história dos direitos humanos, pessoas do campo da saúde mental e pessoas do campo das deficiências trabalharam juntas em torno do mesmo objetivo ― a elaboração da Convenção (SASSAKI, 2010a).

Entre alguns dos impactos socioambientais de um transtorno mental, podemos destacar:

- No indivíduo: aumento do custo de vida para utilização de serviços de saúde e medicação, dificuldade de acesso e manutenção do trabalho, diminuição da qualidade de vida, redução de produtividade, mortalidade prematura, tempo de trabalho perdido.

- Na família: conflitos, sobrecarga de cuidados, pessimismo, dificuldades de relacionamento.

Os transtornos mentais graves podem impactar na funcionalidade psíquica e social gerando dificuldades e limitações tais como: dificuldade de manter as atividades de vida diária, prejuízos funcionais e cognitivos, dificuldade de manter relacionamentos sociais, dificuldade de acesso ao mercado de trabalho. Essas dificuldades são condicionantes das formas de organização da sociedade e produzem efeitos de discriminação e exclusão reprodutores de isolamento e estigma. Se mesmo após tratamento e reabilitação a pessoa permanece com limitações funcionais, a partir dos parâmetros da Classificação Internacional de Funcionalidade, pode estar caracterizada uma deficiência psicossocial (SILVA, LIMA, RAINONE 2016, p. 3).

Em São Paulo, o Programa Inserir realizado pelo ambulatório de esquizofrenia da Escola Paulista de Medicina-Unifesp, tem experimentado desde 2015 a efetiva contratação de seus pacientes em vagas de trabalho pela lei de cotas em grandes empresas. Tornando-se um importante referencial de modelo de empregabilidade para pessoas com esquizofrenia, o Programa Inserir tem buscado representar o direito de acesso ao trabalho para estas pessoas reconhecendo-as como pessoas com deficiência psicossocial. Para isso, além de diversas parcerias com órgãos públicos e privados, elaborou em 2018 um Guia para Gestores, lançado em 2019, que reúne dicas e orientações importantes para promoção da inclusão profissional pela lei de cotas para pessoas com deficiência biopsicossocial por esquizofrenia, em parceria com o Ministério do Trabalho.

Em contato com a tecnologia do Emprego Apoiado e a partir da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (ONU-2008), o Programa INSERIR voltou seus esforços desde 2014 a promover efetivamente a inclusão profissional de pessoas com esquizofrenia pela Lei de Cotas. Como estratégia de política social de acesso ao trabalho, a inclusão profissional de pessoas com esquizofrenia no mercado formal trouxe de forma pioneira a efetiva experiência de gerar sustentabilidade financeira, autonomia e contribuir para superação das barreiras sociais e atitudinais impostas pelo transtorno. (Guia Prático para Gestores, O que você pode fazer para incluir pessoas com esquizofrenia no mercado de trabalho pela lei de cotas? – S. Paulo, 2018)

Em nota técnica 01/2017 a Fundação de Articulação e Desenvolvimento de Políticas Públicas para Pessoas com Deficiência e com Altas Habilidades no Rio Grande do Sul (FADERS) buscou fornecer subsídios para ampliação das perspectivas de acesso das pessoas com deficiência psicossocial nas políticas públicas evidenciando que “Pela primeira vez na história dos direitos humanos, pessoas do campo da saúde mental e pessoas do campo das deficiências trabalharam em torno do mesmo objetivo ― a elaboração da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, reconhecendo que a sequela de um transtorno mental constitui uma categoria de deficiência, estas a colocaram como deficiência psicossocial junto às 3 tradicionais deficiências (física, intelectual, auditiva e visual).

 

Acessibilidade no Trabalho para pessoas com Deficiência Psicossocial por Esquizofrenia

Pessoas com deficiência psicossocial têm encontrado oportunidades de empregabilidade em vagas pela lei de cotas. Exemplo disso é o Programa Inserir, do Proesq (Programa de Esquizofrenia – Escola Paulista de Medicina), que desde 2015, têm efetivado contratações e acompanhado a inclusão de pessoas com esquizofrenia em vagas no mercado formal pela lei de cotas para pessoas com deficiência em parceria com órgãos governamentais como Ministério do Trabalho, Ministério Público do Trabalho, Secretaria Municipal e Estadual de Pessoas com Deficiência e diversas outras instituições pública e privada.

Atualmente, o Inserir contabiliza 38 contratações de pessoas com esquizofrenia em vagas de trabalho pela lei de cotas para pessoas com deficiência, sendo estas contratações informadas pela empresas aos órgãos de fiscalização e controle com a inclusão por deficiência mental.

O funcionamento do Inserir é dentro do ambulatório do Proesq (Unifesp), para pacientes em tratamento há mais de seis meses. Após triagem e avaliações multiprofissionais, os pacientes são inscritos em grupos terapêuticos e grupos de orientações práticas. Com o resultado das avaliações e levantamento de perfil psicológico e profissional, os pacientes são encaminhados para vagas e o Inserir passa a acompanhar os processos seletivos. Com a contratação, a empresa recebe visitas de representantes do Inserir, para orientações sobre a acessibilidade e o contratado é mantido em acompanhamento terapêutico de grupo ou individual por até 12 meses.

Oferecendo amplo mapeamento de habilidades e limitações da pessoa com esquizofrenia através de avaliações biopsicossociais e suporte terapêutico, o Programa Inserir tem utilizado a lei de cotas como estratégia de inclusão sustentável que de acordo com o perfil profissional e psicológico da pessoa, oferece às empresas contratantes informações específicas para melhor integração e produtividade da pessoa com deficiência no ambiente laboral.

A base dessa metodologia é fundamentada no emprego apoiado e no suporte psicossocial por gerenciamento de caso alinhado ao plano singular terapêutico de cada pessoa.

Acredita-se que a lei de cotas e o mercado formal não deve ser a única possibilidade de inclusão profissional. Deve-se respeitar as preferências e habilidades de qualquer pessoa, independente de ter ou não deficiência. Mas como modelo referencial em curso, foi escolhido concentrar os esforços nesse modo de oferta de vagas pela lei de cotas.

 A experiência do Programa Inserir, destaca a necessidade de se avançar nas discussões sobre a empregabilidade da pessoa com deficiência psicossocial por esquizofrenia, adotando todas as formas disponíveis de inclusão profissional e de acordo com as capacidades de cada um, transformando assim, estatísticas mais positivas sobre a presença dessa parcela da população no mercado de trabalho no Brasil.

Raramente se encontram empresas que voluntariamente estejam interessadas em contratar pessoas com deficiência (de qualquer tipo). Se não fosse a obrigatoriedade da contratação por força da lei de cotas, questiona-se se teríamos hoje, um panorama diferente de um século atrás, quando pessoas com deficiência eram compulsoriamente consideradas incapazes ou ainda, inválida.

Com base nas experiências do trabalho realizado pelo Programa Inserir ao longo dos últimos anos, foi possível levantar dados sobre as necessidades de apoio e acessibilidade para pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia para efetiva inclusão no mercado de trabalho formal (dentro ou fora da lei de cotas) com maior assertividade, são estes:

Necessidades de apoio e acessibilidade:

  1. Ininterrupção de suporte clínico e terapêutico:

A empresa deve facilitar o acesso da pessoa em suas consultas regulares com psiquiatra e atendimentos por equipe multiprofissional, para assegurar a continuidade de estabilidade psíquica.

  1. Comunicação clara das atribuições e rotinas profissionais:

Sempre que possível e independente de iniciativa do colaborador no questionamento de dúvidas, deve-se propiciar o diálogo constante para certificação de que a demanda de trabalho esteja sendo compreendida corretamente e evitar assim, interpretações equivocadas ou fora do estabelecido nas responsabilidades. Essa questão é de extrema importância porque geralmente, as pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia são altamente comprometidas e tem grande tendência a serem concretas, rígidas, metódicas e detalhistas, fazendo que cobrem de si demasiadamente e aumentando os riscos de tensão e stress no trabalho.

  1. Carga Horária reduzida:

Recomenda-se a carga horária de trabalho inferior a seis horas diárias e ao menos dois dias de descanso semanal. Pessoas com esquizofrenia fazem uso de medicações (antipsicóticos) que comumente provocam sonolência e com isso, tem uma tolerância menor a sobrecarga de horas de dedicadas ao trabalho que vão desde o tempo gasto no trajeto, como o tempo presencial no ambiente laboral. Sugere-se a carga horária de 30 horas semanais.

  1. Suporte por emprego apoiado:

O emprego apoiado é uma tecnologia assistiva reconhecida pela Lei Brasileira de Inclusão. No aspecto de inclusão profissional, consiste em propiciar apoio técnico profissional, também chamado de agente facilitador e de apoio no ambiente de trabalho (Artigo 37, II, LBI), que facilite a aprendizagem, autonomia, qualidade de vida, inclusão social e intermedie as situações vividas pela pessoa com esquizofrenia, até que este tenha plena independência na realização de suas atribuições.

  1. Conhecimento e informação da empresa sobre as habilidades e dificuldades comuns da pessoa com esquizofrenia:

O estigma e discriminação são as principais barreiras para o acesso da pessoa com deficiência psicossocial no trabalho. O medo e insegurança das empresas na contratação é o que produzem as barreiras atitudinais, ou seja, a relação da postura e atitude de terceiros sobre a pessoa com deficiência. A melhor forma de enfrentamento dessa questão é através da informação. Promover um espaço de escuta e conhecimento sobre esse tipo de deficiência facilitará para que cada vez mais as pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia sejam respeitadas e valorizadas para além de suas limitações.

Conforme Guia Prático para Gestores para inclusão profissional de pessoas com deficiência psicossocial, lançado em 2019 em parceria com o Ministério Público do Trabalho de São Paulo, foi realizado um levantamento dos dados coletados das avaliações psicossociais com os participantes do Programa Inserir que revelaram um perfil comum em pessoas com deficiência psicossocial por esquizofrenia, como descrito no quadro a seguir:

Habilidades comuns

Limitações comuns

Forte senso de responsabilidade;

Rigor com horário e normas institucionais;

Comprometimento com atividades e no cumprimento de tarefas direcionadas;

Bom desenvolvimento acadêmico, intelectual e autonomia;

Senso moral, valores sociais e reciprocidade nas relações formais;

São gentis, prezam pelo respeito ao próximo e são solidários;

Perfil profissional conservador, sistemático, analítico, concreto e introvertido;

São detalhistas e possuem facilidade para trabalhar em atividades que necessitam de paciência e de atenção aos pormenores.

Bom desenvolvimento para atividades profissionais concretas e bem definidas.

Diminuição da capacidade de expressar emoções (embotamento afetivo).

Redução na volição ou iniciativa;

Redução do sentimento de prazer;

Dificuldade em tomar decisões;

Dificuldade em prestar atenção, manter concentração e dificuldades de memória;

Baixa tolerância ao stress.

Dificuldades de comunicação: oral, escrita.

 

 

A acessibilidade da empresa contratante deve ser pautada em uma cultura de diversidade, inclusão, respeito, empatia e com valores institucionais refletidos em todas as práticas gerenciais para toda e qualquer pessoa com ou sem deficiência.

 

Estudo de caso

Conheceremos agora um caso real de inclusão profissional de pessoa com deficiência psicossocial por esquizofrenia que há quatro anos está empregado pela lei de cotas.

Henrique tem 32 anos, Ensino Médio completo e reside na zona leste de São Paulo com os pais.

 

Identificação

Nome completo: HENRIQUE VERISSIMO RIBEIRO

32 anos

Sem filhos, Solteiro

Ensino Médio Completo

Renda familiar aproximada de até 3 salários mínimos

Reside com pai e mãe em São Paulo, Zona Leste

Pai aposentado – 75 anos

Mãe do lar – 66 anos

Tipo de deficiência: MENTAL/PSICOSSOCIAL

Causa da Deficiência:  Adquirida

CID-10 F20 Esquizofrenia

Local de Tratamento

PROESQ – Programa de Esquizofrenia da Escola Paulista de Medicina (Unifesp) - gratuito

Impedimentos nas funções e nas estruturas do corpo

Limitações de funções mentais e psicossociais globais.

Limitações de interação interpessoal

Fatores socioambientais

Alto grau de dependência socioambiental:

Dependente de medicação de alto custo para estabilidade psíquica: Olanzapina e Invega Sustena.

Fragilidade de acesso a recursos de saúde mental próximo de sua residência.

Beneficiário de bilhete de isenção tarifária para transporte público.

Observações: Grau de dependência atribuído é principalmente a necessidade contínua de utilização de medicação com distribuição pelo SUS através de Farmácia de Alto Custo (Olanzapina) e para a medicação Invega Sustena, que é integralmente fornecida pelo PROESQ - uma vez que a mesma não é fornecida no SUS - e a família não tem condições financeiras para pagar (aproximadamente R$ 2mil por dose). Devido vulnerabilidades do sistema de saúde, com frequência, a medicação fornecida pelo SUS fica em falta, colocando-o em risco de recaída.

Limitação no desempenho de atividades

Dificuldades em estabelecer relações interpessoais complexas.

Restrição de participação

Restrição de participação em atividades laborais com sobrecarga de horas de trabalho por dia.

Experiência Profissional anterior

Trabalhou com Auxiliar Técnico em empresa multinacional. Ficou por muito tempo afastado do trabalho após início do transtorno mental e encontrou muita dificuldade. Tinha dificuldades em dar continuidade em atividades que iniciava.

Primeira Experiência na Lei de cotas

Contratado como Jovem Aprendiz com deficiência por uma grande empresa do ramo de transportes em Agosto de 2015, desempenhou a função de Assistente Administrativo, trabalhando quatro horas por dia de segunda à sexta feira, até 2018. Durante o período, realizou curso profissionalizante em importante instituição de ensino vinculada a empresa contratante. Foi reconhecido como um dos melhores alunos de sua turma, sendo inclusive, premiado entre formandos pelo seu bom desempenho, assiduidade e comprometimento.

Segunda Experiência na Lei de Cotas

Em Dezembro de 2018, obteve nova contratação como Jovem Aprendiz com deficiência em grande empresa do ramo de alimentos, trabalhando na função de Promotor de Vendas com contrato de oito meses de trabalho. Tem bom desenvolvimento no trabalho.

Habilidades funcionais

Independência completa para uso do dinheiro, pagar e comprar, realizar transações bancárias, poupar e planejar suas finanças.

Independência completa para utilização de transporte público.

Maiores dificuldades percebidas por Henrique no trabalho

Trajeto de transporte público: aglomeração e demora.

Mudanças que o trabalho proporcionou

Melhor qualidade de vida.

Estruturação de sua rotina com horários e disciplina para dormir e acordar.

 

Considerações Finais

A acessibilidade no trabalho para pessoas com deficiência é um direito garantido e reconhecido mundialmente, independente da exigência de cumprimento por lei de cotas. Configura um novo paradigma de sociedade pautada na inclusão e respeito pelas diferenças, garantindo a todos plena participação social e cidadania.

O crescente aumento dos transtornos mentais em todo o mundo, torna urgente a ampliação do debate e do suporte de políticas públicas que propiciem de forma intersetorial a inclusão social e profissional das pessoas com deficiência psicossocial.

Ao tratarmos sobre a deficiência psicossocial, fica claro que há ainda um longo caminho a se percorrer. Por ser ainda um conceito muito recente, é por muitos desconhecido e carrega marcas de uma trajetória de lutas que ainda não se desvinculou integralmente dos estigmas atribuídos aos transtornos mentais.

Para além do debate ideológico, há a urgência em tratar a saúde mental como um problema de questão social que impacta diretamente no desenvolvimento econômico de toda sociedade.

Oferecer oportunidades de inclusão profissional para pessoas com deficiência psicossocial por transtornos graves e persistentes como a esquizofrenia é, sobretudo valorizar o indivíduo em sua integralidade, que está muito além de um diagnóstico psiquiátrico.

Promover o acesso das pessoas com deficiência psicossocial no trabalho não exige grandes esforços econômicos para contratação e adequação de espaço. O espaço que é preciso adequar e que aqui se sugere, é subjetivo e vai de encontro à postura e atitudes que como sociedade, estabelecemos para literalmente incluirmos com equidade a todos. Dê espaço!

Referência Bibliográfica:

- Lei 8.213/91 Lei Orgânica da Assistência Social, Artigo 93.

- AMARANTE, P. Saúde Mental e Atenção Psicossocial, Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2013.

- Lei Brasileira de Inclusão – Comentada / Joyce Marquezin Setubal, Regiane Alves Costa Fayan (orgs,). Campinas: Fundação FEAC, 2016.

- Guia Prático para Gestores. O que você pode fazer para incluir pessoas com esquizofrenia no mercado de trabalho pela lei de cotas? – S. Paulo, 2018, Programa Inserir-Proesq (Unifesp), Luciene Redondo, Ary Gadelha Alencar Araripe Neto (orgs.).

- Nota Técnica sobre conceito de deficiência psicossocial 01/2017, Porto Alegre, Governo do Estado do Rio Grande do Sul.

- DSM-V, Artmed 2014. American Psychiatric Association.

- A Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência comentada. Brasília, 2008, CORDE.

- Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde. Lisboa, 2004. Tradução e revisão: Amélia Leitão.

- Conhecendo pessoas com deficiência psicossocial. Romeu Kazumi Sassaki, Rio de Janeiro, 2012.

- Instrução Normativa nº 98, de 15 de agosto de 2012. Ministério do Trabalho e Emprego, Secretaria de Inspeção do Trabalho.

- Lei 10.216/01.

- Plano de Ação sobre Saúde Mental 2013-2020, Organização Mundial de Saúde (OMS).

- Saúde Mental e Trabalho/Organização Denise Razzouk, Mauro Gomes Aranha de Lima e Quirino Cordeiro. São Paulo: CREMESP, 2015.