Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário de Santo André/UNIA, especialista em Terapia Comportamental Cognitiva em Saúde Mental pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital da Clinicas da Faculdade de Medicina da USP. Mestre em Psicologia da Saúde pela Universidade Metodista de São Paulo. Atua na área de Diversidade e Inclusão há 27 anos. Experiência na gestão de programas de Diversidade e Inclusão de empresas como SODEXO do Brasil. Há 4 anos faz parte do Grupo de Trabalho de Direitos Humanos das empresas da Rede Brasil do Pacto Global da ONU e tem mais de 25 anos de experiência em diferentes áreas como reabilitação, capacitação e inclusão de pessoas em vulnerabilidade social. Atualmente, é diretor geral da Specialisterne Brasil, organização social de origem dinamarquesa, presente em 21 países, que atua na capacitação e inclusão de pessoas com autismo de alto funcionamento no mercado de trabalho.

Pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)

O tema abordado na aula é extremamente importante para nossa sociedade e trata sobre as pessoas com autismo e sua inclusão profissional.

Em primeiro lugar, as pessoas com autismo têm o direto de ter oportunidades iguais no mercado de trabalho e têm o direito de ter uma metodologia apropriada às suas necessidades, para que possam trabalhar e exercer sua cidadania, e serem cidadãos que possam participar plenamente da nossa sociedade. A aula abordará sobre quem são as pessoas com autismo, as principais características e diagnósticos, e um pouco sobre a fase adulta e a sua inclusão no mercado de trabalho. O que é necessário para uma inclusão com qualidade, onde as pessoas possam trabalhar tendo acessibilidade adequada às suas necessidades. E também contar uma experiência de inclusão com sucesso.

Conteúdo da aula

Quando falamos sobre pessoas com autismo, falamos de um transtorno do neurodesenvolvimento. E esse transtorno, quando pensado na forma de diagnóstico médico, ele é definido pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-5 (referência mundial de critérios para diagnósticos) como TEA - Transtorno do Espectro do Autismo.

As pessoas dentro do Espectro do Autismo podem apresentar déficit na comunicação social ou interação social (como na linguagem verbal ou não verbal e em reciprocidade socioemocional) e também apresentam padrões restritos e repetitivos de comportamento, como movimentos contínuos, alguns interesses fixos e hipo ou hiperreatividade a estímulos sensoriais. Muitas pessoas apresentam dificuldades em relação a estes estímulos.

Cabe lembrar que todas as pessoas com autismo partilham estas dificuldades de comunicação e interação social, mas cada um deles será afetado em intensidades diferentes, resultando em situações bem específicas e particulares. O autismo é uma condição e um transtorno permanente que vai acompanhar a pessoa por todas as etapas da vida e com impactos em todas as áreas já citadas.

Muitas pessoas têm o diagnóstico tardio, já na fase adulta, e isso é extremamente relevante, porque são pessoas que tiveram o histórico de vida muito complicado tanto na educação, experiência universitária, dificuldades de trabalho e lacunas importantes com relação a essa socialização e o quanto isso impactou. Falando ainda das características das pessoas com autismo e focando mais na vida adulta, é relevante lembrar que as pessoas com autismo vão apresentar algumas comorbidades, que são outras dificuldades e possíveis transtornos associados. Parte da população com autismo, acima de 50%, vai apresentar maiores incidências de episódios de depressão e ansiedade. Isso tem um impacto significativo na vida das pessoas, fazendo com que elas tenham que se preocupar em ter um controle e observar essas questões e quanto isso pode impactar a vida profissional, fazendo com que essas questões sejam observadas enquanto apoio e intervenções necessárias para que elas possam trabalhar.

Cabe lembrar também que, quando a gente fala do espectro e dos diferentes tipos de intensidade que se apresenta a questão com o autismo, uma pessoa diagnosticada como de alta funcionalidade (que são as pessoas de alto funcionamento ou Asperger), apresenta prejuízos mais leves, que podem não a impedir de estudar, trabalhar e se relacionar. Como falamos do espectro, têm pessoas com a média funcionalidade que tem um menor grau de independência e necessita de algum auxílio para desempenhar funções cotidianas, como tomar banho ou preparar a sua refeição. Já as pessoas de baixa funcionalidade vão manifestar dificuldades graves e costumam precisar de apoio especializado ao longo da vida.

O TEA – Transtorno do Espectro do Autismo tem uma prevalência maior para meninos, por isso é associado a cor azul. De 5 pessoas com o diagnóstico, são 4 meninos para 1 menina.

Atualmente os dados globais apontam para um aumento dos casos diagnosticados, uma prevalência extrema alta. A cada 59 pessoas que nascem, uma tem o diagnóstico de autismo. Isso representa um dado extremamente relevante, onde mais de 1% da população mundial apresenta o diagnóstico do TEA. E essa prevalência vem aumentando ano a ano.

Conforme mencionado anteriormente, existem pessoas que apresentam alta funcionalidade - que têm o diagnóstico de autismo de alto funcionamento, Asperger, por exemplo. Outras que têm média funcionalidade, que apresentam algumas dificuldades com relação a autonomia e independência e precisam de algum apoio específico e, as pessoas com baixa funcionalidade, que apresentam severas necessidades e importantes dificuldades que vão precisar de apoio especializado por toda sua vida. Pensando em pessoas adultas, temos percebido que algumas metodologias têm tido sucesso, para pessoas com diferentes características. Então, quando falamos de pessoas com autismo que apresentam uma dificuldade mais importante, a metodologia mais indicada é o Emprego Apoiado que visa à inclusão no mercado competitivo de trabalho de pessoas em situação de incapacidade mais significativa, respeitando sempre e reconhecendo suas escolhas, interesses, pontos fortes e necessidades de apoio. O atendido do Emprego Apoiado deve ter a sua disposição, sempre que precisar, os apoios necessários para conseguir obter, manter e se desenvolver no trabalho. Esse é o conceito do emprego apoiado que vem sendo utilizado em vários países e também aqui no Brasil com grande sucesso, com várias organizações trabalhando com essa metodologia.

Também existem algumas experiências que observam as habilidades e competências que as pessoas com autismo apresentam e têm obtido resultados importantes e feito com que as pessoas trabalhem dentro de um contexto inclusivo. A experiência que será compartilhada é desse caso, da Specialisterne Brasil - empresa de atuação do professor Marcelo Vitoriano.

Quando falamos de pessoas com autismo, sempre associamos às pessoas que apresentam dificuldades importantes de comunicação e interação social, mas quando olhamos para algumas pessoas com autismo, a gente observa características que, as chamadas pessoas neurotípicas, que não têm nenhum tipo de dificuldade, geralmente não tem. São pessoas que possuem um raciocínio lógico apurado, capacidade para analisar padrões e encontrar erros, tem atenção e concentração, apresentam também como características a honestidade e, focando nessas habilidades que apresentam, vamos compartilhar essa experiência de olhar para essas habilidades, mas também olhar para as habilidades sociais que precisam ser desenvolvidas por muitas pessoas.

Esse é o trabalho realizado pela Specialisterne, organização de origem dinamarquesa, que está no Brasil desde o final de 2015, e que atua com a formação e inclusão de pessoas com autismo no mercado de trabalho, principalmente na área de tecnologia da informação. Hoje, já foram formadas mais de 95 pessoas, e 75 delas estão trabalhando em diversas empresas, com projetos realizados em São Paulo/SP, São Leopoldo/RS e Rio de Janeiro/RJ. É importante que as empresas comecem a olhar para pessoas que tenham diferentes capacidades, diferentes características, para que elas possam ser efetivamente incluídas.

Atualmente, as grandes empresas têm pensado as questões de diversidade como um valor importante para suas organizações. E as pessoas neurodiversas precisam fazer parte desse escopo da diversidade. Elas têm o direito e podem contribuir para que as empresas tenham resultados e profissionais qualificados. E consigam ter um bom ambiente de trabalho, uma cultura organizacional de respeitar as diferenças, de valorizar o ser humano. Entendemos que as pessoas neurodiversas, além de contribuir com as empresas para trazer boas entregas, elas podem também melhorar a cultura das empresas, humanizar as relações, trazendo como consequência que as empresas sejam espaços melhores para trabalhar, onde as pessoas se sentem mais felizes.

Falamos nesse momento da Neurodiversidade. Esse conceito surgiu de um grupo de pessoas com autismo de alto funcionamento, que entendiam que a questão, principalmente do autismo, não deveria ser olhada pelo foco de uma doença ou apenas de um transtorno, mas sim de uma condição humana diferente, um desenvolvimento neurológico diferente da maioria da população, e que esse desenvolvimento traz algumas características onde as pessoas precisam ser acolhidas pela sociedade e não tratadas. Esse conceito é interessante porque, quando falamos de acolhimento, a gente se refere a proporcionar às pessoas os apoios necessários para sua inclusão no mercado de trabalho competitivo. Falando em habilidades das pessoas e das necessidades de apoio, chegamos ao estudo caso da Specialisterne.

Estudo de caso – Iago B.

Iago descobriu a Specialisterne através de uma pesquisa da sua mãe. Ele com 24 anos, bacharelado pela FEI, com diversas certificações, e ganhador de 2 Olimpíadas de Matemática. Mesmo com esse perfil qualificado, Iago não conseguia entrar no mercado de trabalho. E, quando conseguia uma entrevista, já era bloqueado, porque apresenta muitas características do autismo, certo grau de ansiedade, estereotipias como movimentos de mão, dificuldades de manter contato visual com as outras pessoas. Então, esse conjunto de características fazia com que o Iago não conseguisse ter uma primeira oportunidade no mercado de trabalho, apesar de uma formação muito boa.

Ele veio para a Specialisterne e passou pelo nosso programa de formação técnica e desenvolvimento de habilidades sociais, com duração de 5 meses. Para esse trabalho existe uma equipe com psicólogos e especialistas em tecnologia, que tem por objetivo desenvolver habilidades técnicas e sociais e melhorar a empregabilidade das pessoas com autismo.

Iago teve uma performance muito positiva durante o curso e foi contrato e incluído em um dos principais bancos brasileiros. A partir da sua inclusão no banco, foi feito todo um trabalho de preparação das equipes para recebê-lo, com treinamentos educativos, explicando sobre o autismo, as características do Iago, situações que poderiam acontecer e formas de lidar com essas situações.

Assim que ele começou a trabalhar, Iago precisava de um acompanhamento específico, um acompanhamento de quem entendesse principalmente das características do autismo e gestão de todas as possíveis situações. A Specialisterne teve uma primeira semana com contato diário, período integral, representada pelo psicólogo que acompanhava as atividades que o Iago iria desenvolver, realizando a interlocução com o chefe do Iago – porque, em alguns momentos, a forma de comunicação não era adequada. Então, esse profissional que já conhece as características do autismo, também faz a intermediação dessa comunicação, e por isso esse acompanhamento diário de gestão com as equipes é tão importante. Nas demais semanas, as visitas diminuíram de intensidade, mas aconteciam pelo menos 1 hora na semana. Também existia um apoio não presencial, através de telefone, mensagens e e-mail, para orientar e ajudar em situações de ansiedade.

Todo esse suporte, dado pelo psicólogo da Specialisterne, acontecia em função de algumas necessidades de apoio, como:

Manejo do estresse e ansiedade - Iago recebeu um e-mail de uma pessoa do RH do banco. Entrou em uma crise de ansiedade pois achava que seria desligado de seu trabalho em função de ter sempre pensamentos catastróficos. Outra situação foi quando seu cartão de acesso da catraca eletrônica travou ele não conseguiu passar. Também teve um episódio de ansiedade, pois achava que isto era devido ao possível desligamento da empresa.

Autocuidado / auto percepção - Algumas pessoas podem ter dificuldades quanto aos autocuidados. Para ajudar Iago nesta questão foi feito um checklist diário, para atenção a estes cuidados pessoais.

Interação com a equipe - Nas reuniões que Iago participava, o mesmo fazia muitas perguntas para todos os participantes da reunião, o que atrapalhava bastante a dinâmica das reuniões e causava bastante incômodo. Foi combinado com Iago que ele poderia fazer no máximo 2 perguntas nas reuniões e caso tivesse dúvidas, no final das reuniões poderia falar individualmente com as pessoas para esclarecer suas dúvidas.

Reporte de atividades (preferência pela forma escrita) - Para o bom andamento das atividades, Iago tem maior facilidade em receber orientações escritas e não verbais. Também seus superiores procuram contextualizar as orientações para novas atividades.

Pragmatismo na comunicação - Aqui a orientação é focar nos assuntos. Caso o interlocutor permitisse, ele começava a misturar e emendar diversos assuntos, e perdia totalmente o foco/tema inicial na situação.

Principais pontos da aula

  • Transtorno do Espectro do Autismo – indivíduos únicos
  • Condição que acompanha ao longo da vida
  • Diagnóstico por volta dos 2 anos de idade X Diversos adultos sem diagnóstico
  • Características: Dificuldade na comunicação e interação social, e alterações comportamentais
  • Gênero: Masculino x Feminino 4:1
  • Prevalência: 1 em cada 59 pessoas tem o diagnóstico
  • Trabalho: 85% fora do mercado de trabalho

 

Referências Bibliográficas

Autism Speaks e National Autistic Society, 2008. Disponível em: https://www.autismspeaks.org/information-topic

Austin, Robert D.; Pisano, Gary P. Neurodiversidade como vantagem competitiva. Harvard Business Review Brasil. Jun 2017. Disponível em: http://hbrbr.uol.com.br/neurodiversidade-como-vantagem-competitiva1/

Autismo & Realidade. Disponível em: https://autismoerealidade.org.br

Autismo & Realidade. Disponível em: https://autismoerealidade.org.br/o-que-e-o-autismo/

Associação Nacional do Emprego Apoiado – ANEA. Disponível em: https://www.aneabrasil.org.br/emprego-apoiado

CDC (Centers for Disease Control and Prevention) dos Estados Unidos, 2018 - Surveillance Summaries / April 27, 2018 / 67 (6) ;1–23. Disponível em: https://www.cdc.gov/mmwr/volumes/67/ss/ss6706a1.htm?s_cid=ss6706a1_w

Specialisterne Brasil. Disponível em: http://br.specialisterne.com/

TISMOO. Disponível em: https://tismoo.us/destaques/saiba-como-esta-o-mercado-de-trabalho-para-pessoas-com-autismo/

Mini bio do professor Marcelo Vitoriano

Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário de Santo André/UNIA, especialista em Terapia Comportamental Cognitiva em Saúde Mental pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital da Clinicas da Faculdade de Medicina da USP. Mestre em Psicologia da Saúde pela Universidade Metodista de São Paulo. Atua na área de Diversidade e Inclusão há 27 anos.

Experiência na gestão de programas de Diversidade e Inclusão de empresas como SODEXO do Brasil. Há 4 anos faz parte do Grupo de Trabalho de Direitos Humanos das empresas da Rede Brasil do Pacto Global da ONU e tem mais de 25 anos de experiência em diferentes áreas como reabilitação, capacitação e inclusão de pessoas em vulnerabilidade social. Atualmente, é diretor geral da Specialisterne Brasil, organização social de origem dinamarquesa, presente em 21 países, que atua na capacitação e inclusão de pessoas com autismo de alto funcionamento no mercado de trabalho.

Contatos

https://www.linkedin.com/in/marcelo-vitoriano-68351220

 

Redes sociais - Specialisterne Brasil

https://br.specialisterne.com/

https://www.facebook.com/specialisternebrasil

https://www.instagram.com/specialisterne_br

https://www.linkedin.com/company/specialisterne-brasil